quinta-feira, 2 de julho de 2009

Terra em Transe

"Não anuncio cantos de paz
Nem me interessam as flores do estilo
Como por dia mil notícias amargas
Que definem o meu estilo."

"Não me causam os crepúsculos
A mesma dor da adolescência
Devolvo tranquilo às paisagens
Os vômitos da experiência."

"Os ricos nunca pensam
Que um dia podem acordar pobres."

"Qual o sentido da coerência?
Dizem que é prudente
Observar a História sem sofrer
Até que um dia, pela consciência,
A massa tome o poder."

"Dentro da massa existe o homem
E o homem é difícil de se dominar,
Mais difícil do que a massa."

"Em cada noite há uma aurora
As manhãs não tardam."

"Não é mais possível esta festa de medalhas,
Este feliz aparato de glórias,
Esta esperança dourada nos planaltos,
Não é mais possível esta festa de bandeiras,
Com guerra e Cristo na mesma posição!
Assim não é possível a ingenuidade da fé,
A impotência da fé."

"Não assumimos o nosso passado,
Tolo, raquítico passado,
De preguiças e de preces.
Uma paisagem, um som sobre as almas indolentes,
Essa indolentes raças da servidão a Deus e aos senhores,
Uma passiva fraqueza típica dos indolentes
Ah, não é possível acreditar que tudo isso seja verdade!
Até quando suportaremos?
Até quando, além da fé e da esperança, suportaremos?
Até quando, além da paciência, do amor, suportaremos?
Até quando, além da inconsciência do medo,
Além da nossa infância e da nossa adolescência, suportaremos?

"Ando pelas ruas e vejo o povo magro
Apático, Abatido.
Esse povo não pode acreditar em nenhum partido,
Esse povo alquebrado, cujo sangue sem vigor,
Esse povo precisa da morte, do que se possa supor
O sangue que estimula o meu irmão à dor
O sentimento do nada que gera o amor
A morte como fé, não como temor."

"Não se muda a história com lágrimas."

" A minha loucura é a minha consciência,
E a minha consciência está aqui no momento da verdade
Na hora da decisão, na luta,
Mesmo na certeza da morte!"

" Estou morrendo agora nesta hora,
Estou morrendo neste tempo,
Estão correndo o meu sangue e minhas lágrimas.
Ah Sara, todos vão dizer que sempre fui um louco,
Um romântico, um anarquista..."

"Eu morrerei sem trair
Proclamando a grandeza do homem,
Da natureza, de Deus!"

"Na ponta da minha espada
Trago os restos a paixão
Que herdei daquelas guerras,
Umas de mais, outras de menos,
Testemunhas enclausuradas
Do sangue que nos sustenta."

"A praça é do povo, como o céu é do condor."

" A política e a poesia são demais pra um só homem."






Eldorado, país fictício do realizador de tal longa-metragem. Alecrim, cidade fictícia do mesmo diretor. Quem seria tal criador desse universo poético-dramático? Um bahiano arretado, com o nome não fictício de Glauber Rocha. "Mas por que lidar com a poesia, em meio à miséria e caos?" Existe situação mais interessante? A poesia se encaixa na desgraça de uma forma sublime, contendo tijolos perfeitos para a sua construção. Um país de desordem é criado por Rocha, que nem podemos chamar de nação. "Até que ponto podemos relacionar Eldorado com o nosso querido Brasil?" Até tentar enxergar a perfeição. "Ela existe?" Certamente, porém, talvez nunca a encontraremos, se procurarmos pela mesma. "Alecrim poderia significar Brasília?" Talvez, quem sabe. A ficção é feita sempre com base na realidade. É impossível não relacionar. Um filme surgido nas fossas da ditadura militar, que, evidentemente, é reprimido por aqui, pois mostra uma "ficção real". "Uma ficção real?" Sim, só os cegos de alma não vêem que tal ficção é a mais pura realidade. O que muitos chamam de Cinema Novo, estava sendo erguido, graças à Glauber. Como um filme com Paulo Autran no elenco poderia não ser poético? Assim até o drama mais sórdico vira flores. Enquanto Kubrick fazia ficção-científica de uma forma fenomenal, Rocha fazia ficção-realística sem perder a magnitude. "E a irônia que se encontra nos filmes de Allen? Se encontra aqui também?" Obviamente, porém, sem deixar sinais claros. Demonstrando muito mais a raiva, a revolta, do que a ironia propriamente dita. Rocha parecia não achar graça da desgraça no seu cinema. Nascido em Vitória da Conquista, se tornou o cineasta brasileiro mais aclamado. Vindo a falecer, segundo alguns, de cirrose, aos 42 anos, no Rio de Janeiro. Segundo alguns. Para outros, Glauber é eterno. Paulo Autran nasceu na mesma cidade em que Rocha morreu. Trabalhou com cinema, teatro e televisão. A trinca de sucesso para um encarnador. Além de ter trabalhado na rádio. Para alguns, morreu em São Paulos, aos 85 anos. Para outros, é infinito.

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